Pão Caseiro

Pães são coisas que tiveram história na família, muita história. Minha avó mesmo não costumava fazer, ao menos não que eu me recorde. Lá por 1976 minha mãe ganhou um pão caseiro de uma amiga que morava próximo de casa e se encantou com o sabor. Encarnou na vizinha e pediu-lhe que ensinasse a fazer. A tal vizinha, muito gentil e solícita e sem outra opção que não fosse ensinar, assim o fez, ou pelo menos tentou.

Vou explicar: fazer pão requer, antes de tudo, paciência. É coisa que se adquire com o tempo, bem como a habilidade para sovar e a sensibilidade para sentir o ponto correto da massa.

Assim, é comum que os principiantes nessa arte milenar tenham pouco disso tudo e acabem colocando farinha demais, sovando de menos, aguardando pouco e assando muito seus primeiros pães, com resultados que desafiavam as mandíbulas e dentes dos agraciados com a tarefa de come-los.

Foram muitos pães ao longo de alguns anos que era recomendado comer com um grande copo de líquido por perto pra não afogar. Todos, é claro, com um sabor divino e único, pra comer quentinho, saindo vapor ainda, com manteiga de boa qualidade e um café, mas alguns, depois de frios, podiam ser usados como porrete de tão duros que ficavam. Eu levava sanduíches desses pães para comer no lanche da escola, e pedia para minha mãe colocar uma salada de tomates com o recheio.... um truque para umedecer um pouco e conseguir comer sem ter que ficar abraçado no bebedouro da escola.

Mas o sabor, sempre único. Valia o esforço para comer.

O tempo passou e a técnica se desenvolveu, e os pães dela tornaram-se um sucesso.

Eu mesmo não cheguei ainda nesse ponto, mas pretendo! Essas coisas feias abaixo são o resultado de uma das últimas tentativas que fiz, ficaram muito bons, tanto em sabor como em textura. Só a forma desse da direita que não agradou. Em ambos, e isso posso ver agora, faltou sova - observe que mesmo o melhor deles apresenta alguns caroços. Mais trabalhado eles ficariam mais lisos e elásticos, seriam mais fáceis de modelar, cresceriam mais e ambos ficariam lindos.

Um adendo sobre a gordura usada na massa: da gordura depende o sabor e boa parte da textura de um pão, mas gordura demais pode tornar o pão pesado, então cuidado se for alterar a quantidade. Pode-se usar óleo de soja, de milho, girassol ou mesmo azeite, ou usar manteiga, ou margarina, ou mesmo banha de porco e gordura hidrogenada. Cada uma tem seu sabor característico e vai da preferência do padeiro da vez ou da finalidade que se pretende. 

Em massas para pizza, costumo usar azeite em pequena quantidade, para pães uso óleo mesmo, dando preferência aos de sabor mais neutro. Manteiga e margarina vão bem em pães mais adocicados ou feitos com leite, e banha vai super bem em pães com recheio de linguiça ou torresmo.

E sobre a farinha, uma coisa muito importante é a qualidade da farinha empregada. Você nunca vai conseguir um resultado excelente com ingredientes inferiores. Farinhas boas para pães são as com  maior teor de proteína e bem branquinhas. Tenho usado a Ventureli e gostado muito, achei melhor que a Renata que também é ótima. Farinhas mais escuras me renderam pães mais pesados, mas pode ser devido a alguma variação na sova.

A água depende da qualidade da farinha e do método de sova empregado. Farinhas boas aceitam mais água que farinhas inferiores, e sova mais eficiente permite agregar um pouco mais. Quando mais liquido, mais macia a massa e mais fofinho o pão, mas não se pode ultrapassar a capacidade da farinha em absorver água ou o pão vai ficar esborrachado, vai murchar no forno. Sovar na mão pode pedir água morna, em torno de 26~30ºC. Com tempo e sova mecânica, use água gelada, pois esse tipo de sova aquece a massa e pode atrapalhar a formação da rede de glúten e portanto o crescimento do pão e sua maciez.

Ingredientes para dois pães como os feiosos acima:

500g de farinha (referência)
300 ml de água (60% do peso da farinha)
5g de açúcar (1% - 1 colher bem rasa)
10g de sal (2% - 1 colher rasa)
15g de gordura (3% - 2 colheres rasas)
5g de fermento seco instantâneo para pães ou 15g do fermento fresco (1% ou 3%)

Modo de preparar:

Numa tigela grande ou bacia, coloque a farinha, o açúcar, o sal e o fermento e misture. Faça um buraco no centro e acrescente a água deixando um pouco reservado e misture com as mãos até agregar tudo e sove bem, esticando a massa e dobrando-a sobre si mesma várias vezes em várias direções. Vá colocando mais água bem aos poucos e sove até que a massa comece a querer ficar grudenta. Sove bem até que grude menos. Acrescente a gordura e sove mais para agregar bem, até que a massa fique bem lisa e uniforme. Se você dispuser de uma batedeira capaz de encarar uma massa pesada dessas, use. Em baixa velocidade até agregar bem e depois um pouco mais rápido, por uns 15 minutos. E se tiver um cilindro de massa, desses grandes, passar várias vezes usando uma regulagem larga e dobrando a cada passagem vai lhe render um resultado muito superior.

Cubra com um pano de prato ou tampa e deixe descansar por 30 minutos.

Divida a massa em 2 partes e faça uma bola, primeiramente juntando as pontas como uma trouxinha, esticando bem o lado oposto da massa. Cubra novamente e deixe descansar mais uns 15 a 20 minutos.

Enfarinhe levemente a bancada e coloque uma porção da massa com a parte de  cima para baixo, achate delicadamente e estique, alongando. Enrole a partir de uma das pontas, sempre esticando um pouco e enrolando, esticando e enrolando. No final, vire as pontas mais finas desse rolo para baixo e acomode na forma em que vai assar, polvilhada com farinha, deixando espaço dos lados. Faça o mesmo com a outra bola. Cubra e deixe crescer por ao menos 1 hora. 

Preaqueça o forno a 180º, coloque uma assadeira com um dedo de água fervente no fundo do forno e enforne os pães. Retire a assadeira com água e vire a assadeira dos pães meia volta aos 20 minutos. Deixe dourar.

Se quiser se certificar que os pães estão assados por dentro, pegue um deles com um pano para não se queimar e bata delicadamente com os nós dos dedos na parte inferior e ouça o som. Se soar oco, está perfeito.

Se tudo der certo, você obterá 2 pães como o da esquerda da foto, bem crescidos e fofinhos, com um aroma e sabor inebriantes.

Um último aviso e uma dica: Fazer pão em casa vicia e detona qualquer regime. Coe um café e providencie uma boa manteiga pra comer uma fatia ainda quente e você entenderá o que quero dizer.


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